sábado, 27 de outubro de 2007

Geografia e história de Niterói

Depois de 3 anos e meio trabalhando no Fonseca e cruzando a alameda São BoaVentura, resolvi tomar vergonha na cara e conhecer os lugares que eu sempre alimentei curiosidades, mas nunca ia conhecer. Sempre passo por eles me deslocando para as escolas e a vontade de visitá-los foi crescendo constantemente. Agora era outubro ou nada. Este passeio finalmente se realizou numa sexta-feira e revelou-se um excelente roteiro de trabalho de campo para Geografia e História, pelo que vocês vão ver a seguir. Pode ser tranquilamente realizado a pé e durante uma tarde. O primeiro ponto de parada é a casa de Oliveira Vianna (professor, jurista, historiador e sociólogo brasileiro) que fica no Ponto Cém Réis, no Fonseca, em frente à subida do viaduto que dá acesso à Ponte. Essa casa, tombada em 1992, é hoje um centro de estudos, e possui uma biblioteca com mais de 15 mil exemplares de livros.

Infelizmente neste dia não pude conhecer o interior da residência, pois a chuva dos dias anteriores tinha infiltrado pelo telhado e teto da casa e causado um grande estrago. Pessoas trabalhavam para salvar o patrimônio atingido, principalmente os livros. Contentei-me com os jardins da propriedade, que possui uma grande palmeira imperial, plantas bem cuidadas e uma pequena encosta nos fundos do terreno, coberta de mata. De lá, é possível avistar, entre a folhagem das árvores frondosas, a torre da igreja de São Lourenço da Várzea, que fica do outro lado do viaduto e das ruas que vão formar a alameda São Boaventura - o segundo ponto de visita da tarde. Ampliando a imagem acima, é possível perceber a igreja de São Lourenço dos Índios lá atrás, no Morro de são Lourenço (colada no lado direio da torre em cima da copa da árvore).

A imponente igreja de São Lourenço da Várzea, no Ponto Cem Réis, foi criada para ser a nova sede da freguesia, pois na época a Igreja de São Lourenço dos Índios estava em péssimo estado de conservação. A construção foi iniciada em 1873 e as obras só foram concluídas em 1892. O projeto, em estilo eclético e de tendência neoclássica, teve alteração no formato original da torre, em forma de uma flecha aguda, por uma cúpula em cima de dois corpos decorados de colunas gregas. Sua fachada principal é dominada pela torre central que avança em relação ao resto da nave, e todo o embasamento é de pedra. Na pintura do interior, predominam as cores branca e dourada. Na Revolta da Armada (1891-1892), foi ocupada como quartel, e em 2001 tombada. Reformada, está majestosa.

O caminho entre a Igreja da Várzea e a dos Índios passa por dois casarões desconhecidos de época maltratados pelo tempo e pedindo revitalização (acima). Parei para um lanche na venda da esquina, mas a melhor parada do trajeto depois se revelou ser a pracinha da Igreja de São Lourenço dos Índios, o terceiro ponto. A caminhada a partir dos velhos casarões (pela rua da esquerda da foto) deixa de ser em terreno plano, e começa a subida suave do Morro de São Lourenço. Logo depois virei à direita, e a ladeira seguinte de repente fica muito íngreme: esta é a parte mais difícil do percurso, que exige mais preparo físico. No dia que eu fui o calor era considerável e cheguei no alto suado. O esforço porém é logo recompensado, pois o local do monumento da fundação de Niterói possui uma magia toda especial.

A capela de São Lourenço dos Índios foi fundada em 1627, e elevada à categoria de matriz em 1758. A arquitetura é jesuítica, e a reconstrução de 1768 deu-lhe a aparência que conserva até hoje. A fachada apresenta as janelas ornadas de pedra portuguesa, e também a porta principal, estilo almofada. O interior guarda preciosidades como o retábulo-mór (a obra de arte mais antiga de Niterói) e a imagem de São Lourenço (obra-prima de santeiros portugueses do século XVII). A igreja é tombada desde 1938. Durante a semana ela fica fechada, e como era sexta não pude entrar, pois a zeladora que tem a chave também não estava lá (as visitas devem ser agendadas). Aos domingos, abre às 9 horas da manhã para a missa semanal.

Como a igreja de São Lourenço dos Índios fica no topo de uma colina, numa posição estratégica, tem uma vista ampla e privilegiada da cidade, da baía, das montanhas e do Rio de Janeiro. É possível ver o Maciço da Tijuca (a serra da Carioca e da Tijuca) com os picos do Corcovado - e o Cristo Redentor - e o da Tijuca - o maior do município do Rio com 1.021 metros, nos cantos esquerdo e direito da foto acima, respectivamente. Niterói, água escondida, esconde as águas da Guanabara, visíveis só no canto direito. À esquerda o adensamento de edifícios diminui nosso horizonte visual, e em primeiro plano uma árvore morta mostra que a urbanização, que transformou a cidade na metrópole, deixou a natureza numa situação crítica.

Em frente à igreja tem uma pracinha, com um busto de "Ararigbóia" e no pedestal a data de 22 de novembro de 1573, data em que se comemora a fundação da cidade de Niterói - batizada inicialmente de São Lourenço dos Índios - e feriado municipal. Araribóia, ou Martim Afonso, fica cercado de bancos e à sombra de um belo flamboyant, que dá um charme ainda maior ao lugar. Nesta tarde, crianças brincavam na rua, vira-latas vagueavam, pessoas conversavam tranqüilamente nas calçadas, quase não passavam carros - o ritmo da vida parecia de cidade do interior, bem diferente do frenético da alameda. O "clima" bucólico convida a uma parada confortante sob as árvores, ou à beira da murada, diante de uma bela vista. Paisagem para se desligar da pressa e relaxar. Parece que todo segundo domingo do mês, à tarde, rola um samba na pracinha.

O casarão que eu via do viaduto e até então desconhecia a história é o quarto e útimo ponto de visitação. Ao longe, se destacam também as imponentes palmeiras imperiais. Depois que desci a ladeira da praça da Igreja dos Índios, avistei o portão de entrada que fica praticamente no encontro das ladeiras íngreme e suave. A tarde já caía, e eu consegui entrar depois de tocar o interfone e me identificar. Neste lugar novamente só conheci a parte externa da construção (só entrei mesmo na igreja da Várzea!), o que não deixa de valer a pena, pois as paisagens é que são mais interessantes! Conhecido como Palacete da Soledade - residência dos arcebispos niteroienses e sede do Seminário Arquidiocesano São José - foi propriedade de Francisca Elisa Xavier, a primeira baronesa de Soledade, uma nobre brasileira dona de fazendas que faleceu em 1855 em Niterói.

Casada com o capitão-mór Manuel Francisco Xavier, não tiveram filhos. Embora fosse um grande doador das terras onde se estabeleceu a então vila de Pati do Alferes (os maiores benfeitores da matriz e doadores do cemitério), o capitão-mór Xavier era um homem irascível, de muitas brigas judiciais e pendengas com seus vizinhos. O casal é conhecido por ter sido proprietário do famoso escravo Manoel Congo, revoltoso considerado um símbolo da luta pela liberdade - sua memória é venerada como a de um mártir. Depois de fugir das fazendas, fundar quilombos e resistir à escravidão, foi capturado e condenado. A pedido da baronesa foi poupada a mulher do escravo, Mariana Crioula, obrigada no entanto a assistir a execução pública de seu companheiro, enforcado.

O casarão fica virado para a igreja da Várzea. Junto dele, há mais duas construções mais recentes onde funcionam faculdades de teologia e de filosofia. O conjunto fica no alto de uma colina também, um pouco mais baixa que a igreja dos Índios - a foto acima mostra a vista que se tem do alto da ladeira que chega na pracinha. Diferentes ângulos de um marco arquitetônico da cidade - a torre da igreja da Várzea - visto de lugares cheios de história de Niterói pertos um do outro, separados apenas por uma agradável caminhada. Saí do seminário no fim da tarde, e com o horário de verão e o dia mais longo, pude chegar ao centro nervoso do vale do rio da Vicência - a alameda São Boaventura - ainda com o céu claro. Voltei para casa satisfeito e já pensando na próxima...

3 comentários:

Anônimo disse...

A Niterói Livros possui uma edição totalmente voltada para o Bairro de São Lourenço. É uma leitura que complementa a matéria do blog.

Anônimo disse...

Olá, meu nome é Ingrid e gostaria de te fazer umas breves perguntas sobre o mercado de trabalho para professor de Geografia em Niterói, pode me ajudar ?

ingridok@mpc.com.br

Muito obrigada !

Simone Fig disse...

Oi. Essa sua segunda foto da torre da igreja com as folhas está incrível. Aprendi a andar de bicicleta aí no jardim da igreja. Hj vivo fora do Brasil, mas foi ótimo rever! Vc mandaria essa foto p o meu e-mail? Ficaria super feliz se pudesse imprimir p ter na parede de minha casa! Seja lá qual for a sua resposta, já deixo aqui o meu super obrigada por ter dividido fotos q me levaram de volta a minha infância. 😉😘

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