sábado, 30 de maio de 2009

Geomata 2

"A Cerca"

"Romeu chegou atrasado naquela manhã, a tempo de não mais encontrar seus colegas na sala de aula. Por um momento, esqueceu-se que as aulas de terça e quinta eram ao ar livre. Os alunos aprendiam a ciência do solo e do crescimento das plantas atrás do prédio da universidade, com o mestre Honn. Honn nunca havia cursado uma universidade, mas seu conhecimento e compreensão da natureza eram inquestionáveis. Não lia livros, mas era como se todos já estivessem em seu coração, toda uma vida dedicada à observação e ao experimento, à intimidade com a terra e com o verde. Agora ensinava-se aos pupilos o energético mantra do OM. Melhor dizendo, não se ensinava, fazia-se com que relembrassem o cântico universal que congloba todas as coisas. Após a energização das mudas, porque era importante sim conversar com as pequenas árvores, pois elas também gostam de carinho, Romeu chegou.

A aula de técnicas de jardinagem acontecia ao mesmo tempo que outra turma de Geografia aprendia a arte da carpintaria, com o mestre Kliyd, humilde morador da favela ao lado que havia aprendido com seu pai. Mas tudo isso rolava em outros tempos, num passado que um dia pretendeu ser futuro. Agora havia a cerca. O ambiente no qual todos devíamos sentir o delicado sabor da liberdade agora era vigiado. O desprendimento com o qual todos lidavam e faziam desenvolver o saber era agora domado por correntes, as ditas "correntes do saber" que, no trocadilho ingênuo, só fazem parar e prender. Agora havia critérios rigorosos para formação profissional, havia incontestáveis tabelas e tablóides, controles, situações, posições, estilos, preconceitos, esquemas, sistemas, mentiras.

As ruas esvaziavam-se de gente. Explico: são apenas locais de passagem. A violência trouxe grades, que espantaram a vida e a arte. Não se ficava, apenas se passava. A arte de ficar na rua, vivê-la, vivenciá-la, fora eliminada. Fingia-se buscar soluções para um mundo injusto, mas no fundo copiava-se essa injustiça.

Olhando os passarinhos e ouvindo seus cantos, mas absorto, mergulhado em seus próprios pensamentos, Romeu divagava, e divagava. De repente, voltou à infância, épova em que ainda era criança, quando sua grande curiosidade o guiava floresta adentro, nas férias, à procura de bichos, atraído por toda aquela beleza plena. E agora as aulas ao ar livre. O contato direto com chão, o olhar para o céu, a entrada da frente fria, a visão do Maciço da Tijuca. Não era possível que de uma hora para outra tudo aquilo desaparecesse. Romeu olhava para a cerca que cortava o terreno desapontado com tanto potencial desperdiçado. E novamente a recordação inundou sua mente, a doce lembrança da última aula sobre percepção do espaço com o filósofo Pahnn e da penúltima sobre serrapilheira. Não recuou, não desistiu.

Romeu não era um romântico. Nem tampouco era bobo. Seu cerne era a vida em si, e prosseguir era o caminho, a sua substância, o âmago. Resolveu retomar suas investigações, mesmo só, seu espírito aguçado remexia-se em laboriosa caminhada. E assim continuou, todos os dias após a aula ia para atrás do prédio da universidade e lá ficava. Começou a arrastar consigo seus amigos mais chegados, ciente da importância que tal lugar representava. Às vezes era difícil convencê-los, porque alguns achavam o percurso extenso, com a cerca agora era necessária uma volta maior. Mas quando o grupo se reunia, aí sim, era a glória pa Romeu. A Geografia, esquecida pelos alunos fora das salas de aula e rapidamente discutida dentro delas, aflorava em calorosas e intermináveis discussões. Romeu ficava satisfeito e sentia o prazer do dever cumprido. Era porém preciso cautela, pois já haviam instalado a cerca, e a qualquer momento os burocratas poderiam tomar nova atitude repressora, liderados por Porfírio, o todo-poderoso."


Texto que escrevi com Bernardo Alonso e publicado no Geornal nº 3 (setembro de 1995), sobre a construção de uma cerca que deixou grande parte da Geomata do lado de fora do prédio do CCMN (veja a matéria anterior). No alto, o mapa da Geomata que saiu no nº 4, com a localização de 44 mudas. A ideia de publicar esse material aqui surgiu do interesse de alguns alunos atuais do curso de graduação de Geografia/UFRJ em conhecer essa história. Reuni-o preparando uma apresentação que aconteceu ontem no Fundão, a convite deles, na comemoração do dia do geógrafo. Nessa oportunidade, pude mostrar também um pouco do trabalho que foi e é realizado na EMPF e na E. M. João Brazil, respectivamente.


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quarta-feira, 27 de maio de 2009

Geomata



"Geomata é o nome com que foi batizado o espaço atrás do prédio do CCMN - Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza, UFRJ / Ilha do Fundão - onde foram plantadas diversas espécies de árvores no início deste semestre. Completando agora quatro meses de vida, a Geomata apesar disso é pouco conhecida pelos alunos e por isso buscamos através deste texto contar a história da sua criação.

A idéia surgiu a partir do incentivo do Professor de Biogeografia Evaristo de Castro Júnior, que dispunha de um contato com o arboretum do viveiro da Floresta da Pedra Branca, em Jacaepaguá. Com o apoio do coordenador do Departamento de Geografia, Nelson Fernandes, do administrador do prédio, Zé Maria, e dos funcionários da garagem, especialmente Aparecida e Ricardo, conseguimos a doação de 56 mudas e o transporte das mesmas até o campus, assim como as ferramentas necessárias para o plantio. Dentre as espécies selecionadas, encontram-se Ipê-roxo, Ipê-amarelo, Guapuruvu, Jenipapo, Grumixama, Pau-Ferro, Pitangueira, Mangueira, Cajá-manga, Carobão, Araribá, Sabiá, Sombreiro, Jamelão e Aroeira.

A princípio o plantio seria realizado pelos calouros de Geografia, mas por fatores alheios à nossa vontade isso não aconteceu. Ao invés disso, ocorreu um mutirão envolvendo também alunos dos cursos de Geologia e Matemática, entusiasmados com o projeto, que não se intimidaram com a imensa quantidade de entulho encontrada no solo.

A realização da Geomata prova que iniciativas simples como essa podem interferir realmente no espaço universitário, tornando-o mais agradável e integrado. Fala-se muito mal do campus da Ilha do Fundão, mas pouco se faz para torná-lo um local mais aprazível. Além de embelezar o espaço atrás do prédio, a Geomata permitirá a alunos de todos os cursos acompanhar de perto a evolução de um bosque, recuperando para o convívio de todos uma área degradada.

Por se localizar atrás do prédio, em lugar pouco visível, a Geomata, como muitas outras áreas do campus, infelizmente ainda é muito usada como depósito de lixo. As árvores ainda não foram atingidas por esta agressão, mas isso não quer dizer que elas estejam a salvo, e nem que a Geomata será necessariamente um sucesso. Isso dependerá da participação de cada um, defendendo e zelando pelo espaço. Sabemos que muito do lixo encontrado no local tem origem no próprio prédio do CCMN, o que nos entristece muito. Esperamos que, diante dessa manifestação de carinho, as pessoas se sensibilizem e se interessem pela Geomata. Afinal, deveríamos ser os primeiros a dar o exemplo, certo?"


Texto que escrevi com Gustavo Pacheco para o primeiro Geornal (jornalzinho dos alunos de graduação da Geografia/UFRJ) em junho de 1995. A projeção de slides mostra a Geomata em 2008. As fotos, de cima para baixo: os alunos plantando uma árvore, a galera reunida atrás do prédio nos primórdios, a área onde as primeiras mudas foram plantadas, o viveiro construído depois e a turma em ação. Dia 27 de maio é o dia da Geomata (e também da Mata Atlântica)!

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segunda-feira, 25 de maio de 2009

Mapa na sala

Toda sala de aula deveria ter um mapa na parede. Um ou mais: do Brasil, da América, do Mundo, da vegetação, do clima, da cidade. Parece óbvio, mas a maioria das salas de aula das escolas, públicas ou particulares, não tem um mapa fixo na parede, para os alunos poderem olhar todos os dias, mesmo fora das aulas de Geografia, os mapas. Muitas não tem nem aquele preguinho em cima do quadro para pendurar o mapa que se leva para a sala - salas desertificadas! No 7º ano (ou 6ª série), por exemplo, um mapinha do Brasil na parede é básico...

Uma vez, ensinando na empf a divisão do país em regiões, usei um joguinho na sala onde cada peça era um Estado do Brasil. Com 27 alunos na turma, cada um tinha um Estado nas mãos. Pedi para que se levantassem os que formavam a Região Sul e só um aluno ficou de pé. Perguntei novamente, lembrando que naquele momento dois estavam "comendo mosca" (pelo menos um tinha acertado, pensava). Todos se entreolharam num clima de mistério mas ninguém mais se levantou.

- Bom, então vamos conhecer o único Estado da Região Sul do país: Fulano, qual seu Estado?

- Mato Grosso do Sul...


No alto, sala da emjb do 7º ano com o mapa Brasil - População por Estado (2000 - acima).

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sexta-feira, 22 de maio de 2009

Citronela

Durante todo o ano de 2008 o capim-citronela se desenvolveu no terreno da emjb. Enquanto "seu primo" capim-limão cresceu fazendo o maior sucesso - foi multiplicado, é utilizado para fazer chá quase que diariamente e ainda produz mudas para a comunidade escolar de vez em quando - o capim-citronela foi tão desprezado que recentemente foi transferido de lugar, do sol para a sombra, para ceder mais espaço e não ser confundido com o "primo" famoso. No entanto, uma vez isolado, acabou ficando mais bonito e chamando mais atenção. Resolvi promover esta planta, pesquisando o seu uso e colocando-o em prática na escola. Descobri um grande potencial. Uma das matérias mais interessantes que encontrei na internet foi no site do Correio Braziliense, onde há uma receita simples de repelente ensinada pelo Prof. Marcos Vinícius Martins, da Emater.

Tintura de citronela:
200g da planta seca e triturada.
1 litro de álcool comum (para uso externo) a 70%.
1 vidro de boca larga e escuro, de preferência, com capacidade mínima de 1 litro.
1 frasco escuro para acondicionar.
1 funil.
1 papel filtro.
pano branco e limpo para coar e etiquetar.

O modo correto de fazer é:
Pesar 200g da planta seca e triturada. Colocar num frasco de boca larga. Despejar 1 litro de álcool a 70% sobre a erva. Tampar o frasco e cobrir com papel escuro, se o vidro for claro. Deixar em maceração por no mínimo 8 e no máximo 21 dias, em local seco e protegido da luz. Agitar 2 vezes diariamente. Coar com o pano branco e completar o volume para 1 litro, passando mais álcool a 70% sobre o resíduo da planta. Filtrar em papel filtro e guardar em frasco escuro. Rotular. Validade: 2 anos.

Bem... a pesagem foi feita na intuição. As folhas não estavam tão secas, mas foram cortadas em picadinhos e colocadas no recipiente de vidro escuro com a ajuda de um funil.


O álcool não cobriu a quantidade de folhas acumulada na garrafa e completamos com um pouco de água. A mistura vai ficar agora uns 15 dias de molho na cantina, até a próxima etapa que é a preparação da loção repelente. Aguarde!

Esta primeira experiência despertou a curiosidade de algumas pessoas, outras nem sabiam da existência da planta na hortinha. Divulgar os seus benefícios pode estimular os usos, a produção de mudas e o plantio em outros pontos da escola. A tintura, além de fazer loção repelente, pode ser usada em panos ou borrifadores nas janelas e parapeitos, pois ajuda a afastar os mosquitos. O próprio capim citronela também costuma repeli-los no local onde é cultivado, só com a exalação natural do seu cheiro no balançar do vento. Por isso é uma ótima opção - simples e econômica - para proteger as salas da emjb em tempos de mosquito da dengue.

Saiba mais sobre a citronela em:
blog harmonização de espacos,
arte blog,
site do escritor,
combate a dengue,
revista vigor.

Agradecimentos especiais à Lourdes pela participação na produção desta matéria.

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sábado, 16 de maio de 2009

Almanaque do outono 7

Ontem alunos da turma 3A se mobilizaram para ficar depois da aula participando das atividades na horta. Combinaram em casa de chegar mais tarde e aproveitaram todo o tempo do intervalo dos turnos da manhã e da tarde...

... em outra parte do terreno, iniciaram um novo ciclo demarcando o primeiro canteiro que vai poder ser acompanhado de perto pela turma: fica de frente para a sala onde eles estudam...

... coroas de abacaxi jogadas no lixo foram para a encosta do terreno. Apesar do efeito ornamental, é preciso ficar atento ao acúmulo de água parada...

... a serrapilheira foi acumulada para alimentar o solo em quadrados demarcados com barbante. A molecada da tarde que chegava à escola assistia da grade querendo participar...

... sementes plantadas no início da estação já estão germinando, como o tomate e a couve. Apesar da agricultura ser orgânica, o solo ainda não foi analisado cientificamente para determinar a sua pureza...

... não deu outra: as borboletas já chegaram! Veja a matéria anterior (almanaque nº 6)...

... o capim citronela foi transplantado para o canto do muro, mais sombreado, onde deve diminuir seu ritmo de crescimento. A mudança foi para abrir espaço no canteiro com sol e afastá-lo do capim limão, com quem era sempre confundido...

... em várias partes do terreno cresce espontaneamente essa plantinha com pequenas flores vermelhas. Antigamente achava que era mato...

... algodão-de-preá, bela-emília, pincel-de-estudante e serralhinha são alguns nomes populares da Emilia sonchifolia. Originária da Ásia e naturalizada em todo o território brasileiro, tem uso medicinal e alimentício...

... suas folhas são usadas em saladas e refogados e na forma de chá contra asma, resfriado e amigdalite, embora a eficácia não tenha comprovação científica. Mais um destaque da semana na hortinha da emjb...

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domingo, 10 de maio de 2009

Almanaque do outono 6

Não se sabe quem a plantou ali, se foi alguém ou um passarinho, mas ela cresceu, ganhou força, dominou toda a parte superior da grade e teve até que ter um pedaço arrancado, que sufocava o guaco perto do muro. Esta semana a bucha (Luffa aegyptiaca) foi o destaque na hortinha da emjb: apareceu florida, amarela, cheia de insetos e com frutos se formando. Uma surpresa e um espetáculo - a polinização das plantas, a qualquer hora das manhães.





Também nesta semana aprendi com a Joelma, que aprendeu com seu pai, a plantar corretamente o aipim (Manihot esculenta): ela coloca as estacas deitadas na terra, enquanto eu, antes, fincava-as em pé. Colhemos uma raiz e cortamos o caule da planta em pedaços para multiplicá-lo em brotos. Patrícia levou o alimento para casa e as meninas sugeriram dar um nome para o espaço.


O cambará (Lantana camara) é outra planta que também está se destacando com suas muitas flores. Li recentemente na internet que esta espécie é uma das que mais atraem borboletas e por isso vem sendo muito cultivada na Europa e no Japão, onde o hobby de observá-las vem crescendo bastante. Que venham as borboletas!



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sexta-feira, 8 de maio de 2009

Escala (2)

Atividade que sempre passo para o 6º ano, inspirada no livro Zoom e criada pela minha amiga Lola, professora de Geografia no Rio. O aluno recorta uma figura numa revista ou jornal velho, cola numa folha e a desenha duas vezes: uma mais aproximada e outra mais afastada, mantendo o mesmo enquadramento nessas duas folhas. Depois entrega tudo junto com uma capinha. O objetivo desta tarefa é desenvolver a noção de escala, através do olhar de perto e de longe de uma mesma imagem. No segundo desenho é necessário ampliar a visão da figura escolhida, e aí aparece também a criatividade...



Trabalho de Luana Luciano de Souza, turma 3C da EM João Brazil.

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quarta-feira, 6 de maio de 2009

Eleição honesta



O processo de eleição para escolher a nova diretoria do grêmio da EMJB foi um exercício e um exemplo de cidadania dos alunos. Duas chapas se inscreveram, fizeram uma campanha limpa e no final prevaleceu a democracia, ou seja, a vontade da maioria. Veja o resultado:
Chapa 1 (Nossa força é nossa voz): 166 votos. Vencedora.
Chapa 2 (Não troque o certo pelo duvidoso): 135 votos.
Nulos: 3 votos.
Brancos: 7 votos.
Total de votos: 311.
Abaixo, dois momentos: a comissão eleitoral e o voto na urna. No vídeo, campanha pela internet. Saiba mais aqui!



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